Por Dr. Rev. Wilson do Amaral

Enquanto Jesus viveu na terra foi rotulado de diversos modos. Foi chamado de endemoniado e agente de Belzebu (Mc 3.22), comilão e beberrão (Mt 11.19), blasfemo (Mt 26.65). Até seus parentes concluíram que ele estava fora de si em certo momento de seu ministério (Mc 3.21), ao ponto de ir atrás dele para impedi-lo de continuar a pregar (Mc 3.31).

Sua família chegou à conclusão que Jesus estava fora de si, quando viu sua casa rodeada por gente que ouvira a fama de Jesus e o procurava para receber algum benefício espiritual ou físico. Literalmente a família de Jesus não tinha privacidade e condições nem mesmo para comer em paz (Mc. 3.20). Essa situação beirava o absurdo em suas mentes, afinal, a mudança de Jesus fora muito grande nos últimos tempos, porque se transformara em uma pessoa famosa por toda a região, depois de ter sido um simples carpinteiro (Mc 6.31) durante sua vida toda, e que todos conheciam na pacata cidadezinha de Nazaré.

Embora Maria soubesse da procedência divina de Jesus, o ambiente familiar não lhe era favorável pois seus irmãos não criam nele (Jo 7.5). Jesus sabia que não tinha honra em sua própria casa, nem na cidade onde crescera (Mc 6.4). Naquele dia em que o consideraram fora de si, Maria foi buscá-lo com os seus irmãos em uma determinada casa onde falava a um grupo de pessoas (Mc 3.31), chamando-o para fora com o propósito de que voltasse com eles. Ele estava fora de si na opinião de todos.

De fato, Jesus se tornara estranho para a família, porque passara a dedicar-se inteiramente à sua missão, viajando por toda a Galiléia, atraindo multidões de Decápolis, Jerusalém, Judéia e além do Jordão, ensinando nas sinagogas, pregando o evangelho do reino, com poder de cura, exorcismo, outros sinais prodigiosos, confrontação dos doutores da lei, etc. (Mt 4.23-25).

Além dessa intensa atividade, Jesus passava horas e horas das madrugadas em oração (Mc 6.46). Ele não parava mais, quase não descansava e, quando podia, tirava um cochilo (Mt 8.24). Para uma pessoa fora de si, um lunático – como poderiam pensar seus familiares, Jesus tinha, de fato, postura estranha:

a) Chamava a Deus de seu Pai (Jo 5.17) quando ninguém mais o fazia, porque todos entendiam que Deus era o pai de Israel e não havia quem se aventurasse a ter tal intimidade com o Senhor;

b) Conhecia o Antigo Testamento profundamente, interpretava a lei de Moisés de um modo muito intenso e vivia cada palavra dela (Mt 5.17,18);
c) Discernia os pensamentos de seus opositores (Mc 2.8) e não se confiava a eles (Jo 2.24);
d) Olhava para as multidões e as via como gente sem pastor, embora tivessem os ritos de sua religião e os seguissem (Mt 9.36);
e) Os demônios não podiam resistir-lhe, nem as enfermidades, nem a morte.
Se no entendimento de seus familiares, naquele momento, Jesus estava passando por uma crise de identidade ao personificar o Messias prometido no Antigo Testamento, para muitos de seus discípulos ele era considerado e crido como o Cristo de Deus e, de fato o era.

Na verdade, Jesus estava preocupado em fazer a vontade do Pai (Jo 6.38). Em meio a uma população sofrida, imperfeita e pecadora, que afinal de contas o crucificaria mais adiante, Jesus se apresentou como aquele que veio para servir e dar sua vida em resgate de muitos (Mt 20.28). Essa crise na família de Jesus não o importunou, porque ele continuou a tratar as pessoas com a mesma atenção e deferência. Seu alvo não era agradar homens, mas ao Pai. Sabemos que Jesus nunca esteve fora de si, em momento algum, porque sua vida toda aconteceu de acordo com o propósito e a condução divinos. Ele viveu como nenhum humano viveu – fazendo a vontade do Pai e testemunhando de sua glória em todo o tempo.

Para que isso fosse possível, deixou tudo para trás a fim de cumprir os objetivos de sua vinda. E depois de entregar sua vida e ressuscitar, sua família terrena finalmente veio a crer nele como seu Senhor e Salvador. Disto dão testemunho Tiago e Judas, seus irmãos da parte de Maria, com textos inspirados pelo Espírito Santo entre os livros canônicos do Novo Testamento.

Enfim, a responsabilidade de Cristo para com seu chamado de serviço ao Senhor impactou os primeiros discípulos e deve continuar a impactar e nortear o nosso próprio chamado, pois do mesmo modo, a igreja do Senhor é chamada a viver fora de si, pela graça mediante a fé em Cristo, no sentido de comprometer-se com a causa do evangelho e não se preocupar com o que os outros pensam, comportando-se de modo digno do Senhor na sociedade corrompida pelo pecado.

Aliás, é possível que nós mesmos já tenhamos sido chamados de lunáticos e de pessoas que vivem fora da realidade, porque damos maior importância a Deus e ao seu reino, para depois pensarmos em outras coisas. Não importa o que disserem de nós, não nos deixemos abater pelo mau juízo ou desprezo como o próprio Senhor experimentou. Sejamos seguidores fiéis de Cristo.

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