A epidemia de coronavírus tem conturbado a nossa vida, fechado a economia e matado milhares de pessoas. Se Deus é soberano e bom, alguns estão perguntando: “Por que ele não para a epidemia?”

No âmago de perguntas como essa, há conceitos errados tanto sobre Deus quanto sobre o mundo.

A opinião prevalecente sobre Deus em nossos dias é a do “deísmo moralista terapêutico”. Deus é amável e bom, o que significa que ele quer nos fazer felizes. Ele pode nos ajudar em nossos problemas e quer que também sejamos amáveis e bons. Deus não é especificamente crítico e exigente. Ele simplesmente nos deixa sós.

Esta opinião é predominante entre adolescentes, como pesquisas têm mostrado. Mas também pode ser achada entre teólogos contemporâneos que insistem em que Deus é tão bom que jamais condenaria alguém ao inferno, nem puniria seu Filho em favor dos pecados dos outros. Embora esta opinião sentimental a respeito de Deus apresente-o, aparentemente, numa luz bastante positiva, ela o torna uma falácia nos argumentos dos deístas, os quais asseveram que tal ser é incompatível com o mundo real, com seus sofrimentos, males e epidemias virais. De fato, a deidade do deísmo moralista terapêutico não existe.

De acordo com a Escritura, o Deus que existe é muito diferente. Ele é santo. Ou seja, é infinito, transcendente e glorioso — muito acima e além de nossa compreensão. E deve ser temido. Certamente ele é bom, mas sua justiça se manifesta numa ira aterrorizante contra o pecado. Além disso, por trás do seu julgamento, como Martinho Lutero disse, está o seu amor. Ambas as virtudes são igualmente insondáveis.

Deus é realmente poderoso. Ele criou todas as coisas que existem e continua a sustentá-las. Sua soberania se estende até ao menor detalhe de sua criação. Deus veste os lírios do campo. Alimenta os pássaros e atenta a cada pardal que cai em terra (Mt 6.26-28; 10.29). Ele dá comida ao leãozinho quando ele salta sobre a presa (Sl 104.21). Segue-se que o coronavírus existe e é sustentado de acordo com o plano soberano de Deus para a criação.

Se Deus é mais complexo do que a opinião popular, isso também pode ser dito a respeito do mundo. Em sua condição presente, o mundo não deve ser um lugar seguro, livre de problemas e sempre feliz. Este é mundo caído por causa do peado. É um ambiente de morte, transitoriedade e futilidade. É um lugar em que o Diabo vagueia e nós sofremos, inclusive de doenças como o coronavírus.

Isto é a vontade de Deus? Sim. Além disso, o pecado é, por definição, uma violação da vontade revelada de Deus. Portanto, ainda que o mundo pecaminoso desafie a vontade revelada de Deus, sustentar este mundo é vontade soberana de Deus. É bom para nós que Deus sustente o mundo; do contrário, pereceríamos com tudo mais que é mau.

A segunda Pessoa da Trindade se tornou carne, neste mundo enfermo de pecado, e, em seu poder soberano, levou sobre si mesmo a ira devida ao pecado e o sofrimento deste mundo infestado de pragas.

Por que Deus não fez tudo bom e perfeito? Ele o fez — no paraíso que rejeitamos — e fará, no paraíso eterno que preparou para seu povo. Nesse ínterim, devemos viver neste mundo imperfeito, o que é, em si mesmo, uma manifestação da ira de Deus contra o pecado. Mas este é também o lugar em que Deus nos redime desse pecado.

Deus mesmo entrou neste mundo caído, na encarnação de Jesus Cristo, que se submeteu ao pecador e morte deste mundo a fim de nos salvar. E este é o ambiente em que os salvos são chamados a lutar contra o pecado, resistir à tentação, opor-se ao mal, fazer boas obras e experimentar tribulações e provações que fortalecerão sua fé e os prepararão para a vida eterna.

O mundo caído é uma lugar difícil para vivermos. Mas a soberania de Deus mitiga esse mundo. Embora as coisas más que acontecem estejam de acordo com a vontade soberana de Deus, ele continua a amar a sua criação. As belezas, satisfações e prazeres da vida são os sinais mais profundos da soberania de Deus.

Na Bíblia, as pragas e pestilências vêm da mão de Deus como sinais de sua ira contra o pecado. Ou seja, não são apenas punições por transgressões coletivas ou individuais. Em vez disso, elas representam o julgamento de Deus e também seu plano de salvação.

As pragas do Egito afligiram Faraó e toda a sua nação, exceto aqueles que estavam abrigados em casas marcadas pelo sangue do cordeiro (Êx 7-12). Posteriormente, Deus puniu seu povo rebelde por enviar uma praga, por causa da qual o sacerdote Arão tomou incenso do altar de sacrifício “e fez expiação pelo povo. Pôs-se em pé entre os mortos e os vivos; e cessou a praga”    (Nm 16.47-48). Quando o rei Davi pecou, o Senhor o deixou escolher sua punição: fome, guerra ou pestilência.

Davi escolheu a última, dizendo: “Caiamos nas mãos do Senhor, porque muitas são as suas misericórdias; mas, nas mãos dos homens, não caia eu” (2Sm 24.14). O anjo da praga matou 70.000 pessoas, causando a oração de arrependimento e confissão de Davi: “Seja, pois, a tua mão contra mim e contra a casa de meu pai” (v. 17). Deus cessou a praga na eira de Araúna, o jebuseu (v. 18), que se tornaria o local do templo (2Cr 3.1). Estes acontecimentos são todos profecias da pessoa e da obra de Jesus Cristo.

Jesus é o curador de pragas (Lc 7.21). Mateus faz um comentário sobre uma das curas de Jesus: “Para que se cumprisse o que fora dito por intermédio do profeta Isaías: Ele mesmo tomou as nossas enfermidades e carregou com as nossas doenças” (Mt 8.17). Mateus se refere a Isaías 53.4: “Certamente, ele tomou sobre si as nossas enfermidades e as nossas dores levou sobre si” (Is 53.4). Essas palavras hebraicas que se referem a sofrimento levam consigo o significado de enfermidade. Portanto, a segunda Pessoa da Trindade se tornou carne, neste mundo enfermo de pecado, e, em seu poder soberano, levou sobre si mesmo a ira devida ao pecado e o sofrimento deste mundo infestado de pragas.

À luz da soberania de Deus, catástrofes como o coronavírus devem lembrar-nos a acumular “tesouros no céu, onde traça nem ferrugem corrói, e onde ladrões não escavam, nem roubam” (Mt 6.19-20). Devemos suportá-las com arrependimento (Lc 13.5), apegar-nos a Cristo pela fé (Sl 63.8), orar por livramento (Mt 6.13) e vivenciar a nossa fé — especialmente em nossas vocações de trabalho, família, igreja e cidadania — em amor e serviço ao nosso próximo (Mt 22.36-40). E, por causa da soberania de Deus, podemos firmar-nos em sua promessa: “Sabemos que todas as coisas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são chamados segundo o seu propósito” (Rm 8.28).

(Extraído do site: voltemosaoevangelho.com

Gene Edward Veith

CategoryArtigos, Pastoral
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